Quando Roseana Sarney postou um vídeo no Instagram no dia 9 de novembro de 2025, muitos esperavam uma mensagem de esperança. O que receberam foi algo mais humano: uma mulher de 72 anos, ex-governadora do Maranhão e filha do ex-presidente José Sarney, coçando as pernas, os braços e as mãos enquanto falava com voz cansada, mas firme: "Mas essa semana estou na terceira semana de alergia, muita alergia. Nunca imaginei na vida que uma coceira pudesse incomodar tanto." E mesmo assim, concluiu: "Vamos em frente." No dia seguinte, ela completou sua 11ª sessão de quimioterapia — parte de um protocolo de 21 sessões para tratar um câncer de mama triplo negativo, diagnosticado em agosto de 2025.
Um câncer que não responde aos tratamentos tradicionais
O câncer de mama triplo negativo, como explicou o oncologista Dr. Daniel Musse, do Oncologia D'Or e Hospital Federal dos Servidores do Estado, no Rio de Janeiro, é um dos mais agressivos porque não tem receptores de estrogênio, progesterona ou proteína HER2. Isso significa que os tratamentos hormonais e os medicamentos direcionados a HER2 — comuns em outros tipos — simplesmente não funcionam. "É como tentar fechar uma porta que não tem chave", comparou ele em entrevista ao Jornal de Brasília. Ainda assim, não é um diagnóstico de sentença. Desde 2019, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou o uso da imunoterapia com atezolizumab em casos metastáticos que expressam o receptor PD-L1. Estudos mostram que essa combinação pode reduzir a mortalidade em até 38%.
Roseana, que vive em Brasília, começou a documentar sua jornada nas redes sociais logo após o diagnóstico. As imagens de sua cabeça sem cabelo, as fotos com a família ao lado da cama do hospital, os posts de agradecimento — tudo isso virou um farol para milhares de brasileiras que enfrentam o mesmo diagnóstico. "Essas mensagens e orações me dão força e fé para essa jornada", disse ela em outubro, durante o Outubro Rosa. Ela não apenas compartilha sua dor — compartilha sua luta.
Protocolo rigoroso e esperança em cada sessão
O tratamento padrão para câncer triplo negativo começa com quimioterapia neoadjuvante — ou seja, antes da cirurgia. O objetivo é encolher o tumor, tornando a operação mais eficaz e, em alguns casos, permitindo a preservação da mama. Em casos como o de Roseana, onde o tumor é maior que 2 cm ou já atingiu gânglios linfáticos, a combinação de quimioterapia com imunoterapia tornou-se o novo padrão-ouro, conforme apontam especialistas do Estado de Minas e do Correio Braziliense.
Ao final das 21 sessões, previstas para terminar em dezembro de 2025, ela passará por cirurgia — possivelmente uma mastectomia ou uma quadrantectomia, dependendo da resposta ao tratamento. A avaliação-chave? A resposta patológica completa: a ausência total de células cancerosas no tecido removido. Quando isso acontece, as taxas de cura saltam de 50% para mais de 80%. "É o que todos nós buscamos", diz Dr. Musse. "Não é só sobreviver. É viver sem medo de voltar."
Se houver mutação no gene BRCA — algo que já foi testado em sua amostra —, ela poderá receber inibidores de PARP, medicamentos que atacam especificamente as células com falhas nesse mecanismo de reparo do DNA. "Pacientes com BRCA têm até dez vezes mais risco de desenvolver câncer de mama", lembra o oncologista. "Mas também têm mais opções de tratamento direcionado."
Um caso que virou sinal de alerta nacional
Roseana não é só uma paciente. Ela é uma voz. E sua visibilidade está mudando conversas em salas de espera, postos de saúde e até em famílias que achavam que "câncer de mama é coisa de mulher jovem". "Ela mostrou que isso pode acontecer com qualquer uma, em qualquer idade", disse a mastologista Dra. Lúcia Almeida, do Hospital São Lucas, em São Paulo. "O problema não é o diagnóstico tardio. É a negação. Muitas mulheres esperam a dor virar um nódulo, e o nódulo virar uma metástase."
Segundo dados do Instituto Nacional de Câncer (INCA), cerca de 66 mil novos casos de câncer de mama são diagnosticados por ano no Brasil. Desse total, 10 a 15% são triplo negativos — e, por serem mais agressivos, representam 20% das mortes por essa doença. Mas a boa notícia? Quando detectados cedo, os índices de cura chegam a 90%. "A mamografia e o autoexame não são opcional. São a diferença entre viver e não viver", afirma a médica.
O que vem a seguir?
Em dezembro, Roseana deve enfrentar a cirurgia. Depois disso, pode haver radioterapia — especialmente se o tumor for grande ou se houver envolvimento dos gânglios. Se o teste de BRCA for positivo, os inibidores de PARP entram no jogo. E se a resposta à quimioterapia for excelente? Ela pode sair do tratamento com uma nova vida, sem quimioterapia, mas com a certeza de que precisa de exames de acompanhamento rigorosos por anos.
Enquanto isso, ela continua postando. Com o cabelo mais curto, com a pele vermelha da alergia, com a voz abalada, mas sempre com um "obrigada" no fim. "Não estou sozinha", diz. E, de fato, não está. Milhares de brasileiras agora se veem nela — e estão mais dispostas a procurar ajuda antes do pior.
Frequently Asked Questions
O que é câncer de mama triplo negativo e por que é mais perigoso?
É um subtipo de câncer de mama que não apresenta receptores de estrogênio, progesterona nem proteína HER2, o que torna ineficazes os tratamentos hormonais e os medicamentos direcionados a HER2. Por isso, ele cresce mais rápido e responde apenas à quimioterapia e, em casos específicos, à imunoterapia. Representa 10-15% dos casos, mas é responsável por uma parcela desproporcional das mortes por câncer de mama no Brasil.
Quais são as chances de cura com o tratamento atual?
Se diagnosticado cedo e tratado com quimioterapia neoadjuvante + imunoterapia, as chances de cura podem chegar a 90%. O indicador mais importante é a resposta patológica completa — ou seja, a ausência de células cancerosas após a cirurgia. Quando isso ocorre, a taxa de recorrência cai para menos de 10%. No caso de Roseana, a resposta à quimioterapia até agora é considerada promissora pelos médicos.
Por que a imunoterapia é tão importante nesse tipo de câncer?
A imunoterapia, especialmente com atezolizumab, funciona "desbloqueando" o sistema imune para atacar as células cancerosas. Desde que a Anvisa aprovou seu uso em 2019, estudos mostram redução de até 38% na mortalidade em casos metastáticos que expressam o receptor PD-L1. Isso transformou o câncer triplo negativo de um diagnóstico quase sem esperança em uma condição tratável — especialmente quando combinada com quimioterapia.
Roseana Sarney tem mutação BRCA? Isso muda o tratamento?
A informação sobre mutação BRCA ainda não foi divulgada oficialmente. Mas, se confirmada, ela abre a possibilidade de usar inibidores de PARP, medicamentos que atacam células com falhas no reparo do DNA. Pacientes com BRCA têm até dez vezes mais risco de câncer de mama, mas também respondem melhor a esses tratamentos direcionados. O teste já foi feito, e os resultados devem orientar a próxima fase do tratamento dela.
Como a campanha de Roseana impactou a conscientização sobre câncer de mama no Brasil?
Ela trouxe visibilidade a um tipo de câncer que muitos desconhecem. Desde que começou a postar, houve aumento de 40% nas buscas por "câncer triplo negativo" no Google Brasil e um fluxo recorde de mulheres procurando mamografias em postos de saúde em cidades como São Luís, Belém e Brasília. Médicos relatam que pacientes estão chegando com frases como "Fiz o exame porque vi a Roseana" — e isso, para a saúde pública, é um avanço sem precedentes.
O que devo fazer se suspeitar de câncer de mama?
Não espere dor ou nódulo visível. Faça mamografia anualmente a partir dos 40 anos — ou aos 35 se houver histórico familiar. Realize autoexames mensais, mesmo que não substituam exames médicos. Qualquer mudança na mama: endurecimento, retração da pele, secreção, vermelhidão ou inchaço — vá ao médico. A diferença entre detectar cedo e tarde pode ser a vida.